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Deus

Quarta-feira, 25.04.12

Deus é mesmo estúpido, rouba-nos cedo os úteis

 

“Gostaria de chegar ao fim da vida, olhar para trás e dizer que fiz algumas asneiras, mas que valeu a pena porque ajudei os outros”

 

Miguel Portas

 

(Blogue – Denúncia Coimbrã)

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publicado por Produções Anormais - Albufeira às 17:01

Histórias de Portugal

Quarta-feira, 25.04.12

Lá longe, no 25 de Abril

 

Homenagem a GC-L e a todos os nossos Antepassados (para que não sejam esmagados pelo tempo e esquecidos pelos espaços partilhados)

 

“Não é esmagando a memória de um povo e violando sistematicamente a sua cultura que se respeitam os nossos antepassados, aqueles que com tanto carinho e amor nos criaram, apesar de todas as dores e sacrifícios por que passaram, com um único objetivo de oferecerem aos seus filhos, um mundo melhor e diferente do que aquele em que sempre viveram”

 

Fotografias de um grande artista português sobre o seu país – Portugal – englobando os últimos cinquenta anos de História.

 

Quando eu era jovem só associava o seu nome às projeções de filmes nas grandes salas de cinema, um dos poucos ou único oásis de cultura e prazer existentes no Portugal anterior ao 25 de Abril de 1974 e tão utilizado na minha juventude por todas as camadas etárias, desde a minha avó – com os seus filmes com romanos – aos mais novos – com os famosos filmes de cowboys ou de ação e de aventuras. Vi muitos filmes que me ajudaram a formar a minha personalidade – a aprender e a ser educado – mas com essa opção, com a leitura e com a fotografia, prejudiquei os meus estudos, não conseguindo chegar a chefe para toda a vida e sem respeito por ninguém – a quem Alberto Pimenta chamaria e com toda a razão, um verdadeiro filho-da-puta.

 

Por Gérard Castello-Lopes

 

 

A espera persistente e paciente por novidades que invertessem o destino empobrecido deste povo, foi desde sempre uma das principais marcas do anterior regime, sujeitando um povo perseguido e abandonado à sua sorte, às mãos de uma esperança de concretização utópica, face às armadilhas do regime então instalado, que via o trabalhador como mais uma ferramenta irracional, sem direitos e descartável, mas com deveres de prestação de serviços a quem os mantinha vivos e embrutecidos – chegando a ser obrigados a oferecerem os seus filhos, para a carnificina colonial. Mas este hábito de ficar à espera coçando as costas às esquinas disponíveis, ainda é um hábito e desporto nacional!

 

      

 

A pobreza de um povo pode ser analisada sob as mais variadas perspetivas e pelas mais variadas classes sociais, mais leigas ou mais eruditas, mais pobres ou mais privilegiadas. No entanto só o próprio ser humano que passa por essa experiência pode falar por conhecimento próprio, contando os seus relatos vividos e presenciados, como aqui o faz GC-L através da fotografia e para lá de todas as suas crenças ou opções políticas. Nestas duas fotografias se retrata a alegria e a força de um povo pobre mas solidário, mesmo quando abandonado pela elite do seu país – o que parece querer repetir-se neste século XXI, talvez a ser futuramente considerado, o século perdido.

 

 

A Igreja foi no passado século XX apenas mais uma das fachadas do regime, em que muitos colaboraram para o embrutecimento do povo – especialmente a hierarquia superior que queria manter “tudo como estava” com o regime, para poder continuar a manter a sua forte presença na sociedade – mas em que muitos outros padres e devotos se sacrificaram por esta, passando incógnitos para a história do nosso país, sob as canetas guilhotina dos escrivas do regime. Em cada grupo existe sempre uma imensidade de oportunistas que só procuram a sua felicidade desprezando os sentimentos dos outros; no entanto existem muitas e muitas outras imensidades sem limites, que apenas desejam viver com os outros e com a natureza, uma vida normal, sem a treta do tempo (morte) e a companhia forçada do bem e do mal (a ética e a moral, dos indivíduos sem caracter).

 

      

 

A espera e solidão são duas das principais características que definem bem o Portugal de ontem, de hoje (infelizmente) e provavelmente de amanhã (com esta sociedade, existe algum futuro para nós?). A nossa pobreza escondida dos outros também e como nós pobres, ainda é uma forma de sobrevivermos com fome, com frio e com dores, de modo a não perturbarmos os poderosos, que ainda nos poderão fazer pior, para nosso bem e para calar todos os invejosos. Podiam muito bem estes “retratos” representar hoje a destruição das células sociais, por abandono consciente das populações e zonas empobrecidas e pela criação de falsos entrepostos sociais, que pretensamente nos poderão arranjar emprego, desde que não pretendamos receber.

 

 

Vivi muitos anos em Espinho – aproximadamente 14 anos da minha juventude – e ainda me lembro de ver os belos mas frágeis barcos dos pescadores, no regresso da sua faina sobre o mar alteroso e perigoso de Espinho, que muitas aflições e tristezas (mas também alegrias) trouxeram às nobres e lutadoras famílias dos pescadores (não esquecendo as vareiras e as suas típicas canastras, expondo para venda ao seu povo, o peixe fresco apanhado na costa). Era ver as juntas de bois no seu trabalho de ajuda para deslocar os barcos e as redes entre a praia e o mar – vendo o sulco do suor do trabalho árduo de todos, nas areias brancas arrastadas pela praia – com a presença constante de todas as famílias e de muitos outros curiosos e com a presença sempre atenta das gaivotas, à procura daquilo que para elas sobraria e as alimentaria. Apesar da pobreza e de todas as limitações, todos procuravam remar para o mesmo lado, porque sabiam ao contrário do que se pensa hoje em dia, que se tal não fizessem, seria o seu fim (não mais adiado) e o de todos os restantes. Pode-se matar um país, usando apenas a indiferença!

 

 

O polícia nunca atingiu o estatuto atribuído às Forças Armadas ou à Guarda Nacional Republicana: como um grupo de apátridas analfabetos, ficou ali entalada entre as forças militarizadas e os novos licenciados do regime. Apesar de uma maior ligação aos problemas com que o povo se deparava – porque de lá eram maioritariamente originários – sempre foram desprezados pelo sistema que os criara, apenas porque o seu papel era o de impor ao seu povo o respeito sem dúvidas pelos seus dirigentes, protegidos por uma farda, por um cassetete e provavelmente por uma pistola com balas. Eram simples seguranças instalados nas ruas das nossas terras, por vezes sem grandes estudos ou sem grandes ambições – neste país sem horizontes, então subdesenvolvido, solitário e campeão da emigração – mas que pelo menos, também se misturavam, viviam e se confundiam connosco.

 

 

O Sud-Express foi um dos símbolos da emigração portuguesa, que levou milhões de indivíduos desesperados a recorrerem à fuga para o estrangeiro, para assim poderem fugir à sua morte lenta no seu próprio país, sua pátria original e a procurarem a sua salvação por outras terras distantes e desconhecidas, mais acolhedoras e respeitadores dos direitos do homem. A saudade era imensa, o amor pela terra nunca os deixava descansados, alguns ainda regressavam a casa indo morrer para as colónias, mas mesmo assim, nunca o país lhes abriu completamente as portas como o fez com os seus depósitos bancários. Ainda me lembro já após o 25 de Abril de assistir no regresso de França a Portugal, viajando no Sud-Express, às manifestações incontroladas de um marido que já não via a sua mulher há muitos meses ou anos e que constantemente, primeiro sorrateiramente e depois sorridente e às claras, a apalpava para deleite de ambos – o que para nós era uma delícia de ver pela felicidade que constatávamos e partilhávamos, apesar de apinhados como animais, nos compartimentos e corredores deste tão instrutivo comboio.

 

E Portugal Hoje?

 

 

“Portugal aproxima-se de uma época em que, se as coisas continuarem a evoluir como atualmente acontece, estalará mais um conflito violento entre aqueles que nada tem e aqueles que tudo querem, que poderá levar desta vez definitivamente, à nossa extinção como estado e como povo independente – como fazem os traidores deixaremos de existir e entregaremos nas mãos dos outros a nossa salvação mas já sem memória, sem cultura, completamente acéfalos. E aí só me restará agradecer antes de morrer, a quem me ensinou antigamente a saber ler e escrever”

 

(fotos de GC-L – exceto a primeira e a última)

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publicado por Produções Anormais - Albufeira às 11:30