ALBUFEIRA
Um espelho que reflecte a vida, que passa por nós num segundo (espelho)
Contos e Fantasia
Albufeira – Ficheiros Secretos
Viagens à Terra Prometida
(destinado a crianças, adultos e alienígenas)
Os adultos também gostam de ser crianças e muitos deles são-no para toda a vida
O Meu Amigo Desconhecido
Apresentação
Quando menos esperamos ele aparece e preservando a nossa liberdade, nunca quer nada de nós. Apenas partilhar o mesmo espaço e trocar experiências connosco.
I. Chegada
YODA, o grande orelhudo – Grande Mestre da Ordem de JEDI
O ALIEN tinha três antenas na cabeça: uma era verde, a outra era azul e a do meio era vermelha. Por vezes as duas antenas do lado rodavam sobre a sua cabeça, a da esquerda ia para a direita, a da direita ia para a esquerda e até a do meio parecia ir subindo e descendo.
Não tinha cabelo, os olhos davam-lhe um aspeto de chinês, a boca e o nariz eram pouco expressivas, mas quanto às orelhas era diferente, enormes e notáveis, parecendo mesmo as orelhas do elefante Dumbo.
Estava nu, não tinha pelos no corpo, os seus membros eram compridos e longilíneos e quanto a órgão sexual nem vê-lo, fosse atrás, fosse à frente ou noutro lado qualquer. À cintura tinha uma espécie de bolsas carregadas de fios e aparelhos e colocado no cimo da sua cabeça uma luzinha pequenina que acendia e apagava como a luz dum avião.
Então educadamente pediu-me para entrar, eu disse que sim e à sua passagem, fechei a porta atrás de mim.
II. Permanência
A Casa é como um Mundo, com uma grande fortaleza a defendê-la – e essa somos nós
A sala de jantar estava quentinha, com a lareira a funcionar desde o início da tarde e o cheiro delicioso da comida a espalhar-se por toda a casa. A temperatura tinha descido acentuadamente e talvez caísse geada durante a noite. Talvez por esse motivo a Dona Micas andasse por ali a circular, transportando pratos e tachos de um lado para o outro. As batatas coziam numa panela de ferro posta sobre o carvão da lareira e a pouca carne disponível era guisada numa caçarola de barro, misturada com frescos e coloridos vegetais, que pareciam todos fazer parte da ornamentação deste prato fumegante e de por água na boca.
A Dona primeira assustou-se, mas habituada a tantas coisas passadas na sua vida, lá o recebeu entre os braços, calorosa e sorridente e envolvendo o desconhecido num amplo abraço de plena aceitação e amizade, bem sentido pelo ALIEN com a pressão exercida sobre o seu frágil corpo, pelo peito e barriga desta espantosa velhinha. Pediu permissão e sentou-se à mesa de jantar, aqueceu os seus pés na escalfeta sob a mesa colocada e envolvendo as suas mãos no tecido que a cobria, sentiu o calor tomar posse do seu corpo, numa sensação única e mágica, ainda-por-cima catapultada pelo ambiente terno e aconchegante de tudo o que via e o rodeava.
Todos os sentidos do desconhecido funcionaram numa delícia permanente, complementando-se no puro prazer do momento. A comida apresentada era excelente, as bebidas punham-no um pouco tonto mas eufórico e até a conversa de conveniência parecia encaixar-se perfeitamente no conteúdo de todo o menu. No fim vieram os doces, essas delícias exclusivas do planeta Terra e que provocavam explosões fantásticas de sensações nos seus órgãos do gosto, potenciadas ao infinito pelo sentido do olfato e mesmo pelo sentido da visão – como autênticas drogas alucinogénias! E para deitar o ALIEN abaixo, um cálice de Porto para aquecer a alma.
III. Partida
Nós os terrestres não conseguimos viver sem os nossos companheiros de estrada, vivos ou mortos
A conversa estendeu-se pela noite dentro contando com a minha humilde participação, com a sabedoria da velha mas bem lúcida Dona Micas e com o desconhecido extraterrestre, todos acompanhados pela irrequieta FRIFRI e pelos seus animais domésticos em polvorosa, já que estes queriam dormir e ela só os queria ver a mexer – o circo da criança tinha que funcionar às-mil-maravilhas para o estranho e engraçado convidado, talvez para ela, um artista de circo ou até mesmo um palhaço. O ALIEN entendeu o pensamento da criança e sorriu para ela como mais um colega de brincadeira.
Tudo o que o ALIEN pretendia com esta sua aparição inesperada, era inteirar-se da capacidade de aceitação e partilha dos comuns terrestres – postos face a situações não conformes com as suas regras assimiladas – a alterações profundas na sua visão geral do mundo, racional e limitada e muitas das vezes medíocre. A dona tinha falado de tudo um pouco, sem necessidade de ligação de ideias ou de discurso, mas com afirmações bem compreensíveis e aceitáveis, até pela beleza conjunta de um corpo velho e cansado mas por outro lado e em contraponto, ainda aberto ao desconhecido e forte em anseios, vontades e desejos. Por sua vez a criança era a fonte de vida de toda aquela casa, rodeada de animais que com ela viviam e brincavam e centro de todas as expetativas passadas, presentes e futuras de todo um grupo de seres vivos, exigindo ao Universo o seu reconhecimento. Eu para ele era tudo isto e ainda aquele porteiro que lhe abrira mais um caminho da vida, no seu já vasto conhecimento ancestral.
Olhei para ele e parecia estar a chorar. Abraçou-me com amor e beijou-me efusivamente na cara como se quisesse deixar nela um sinal seu e levar na dele, o sentimento da presença de outros mundos no seu mundo. Estava muito frio e as despedidas foram rápidas. O ALIEN envolveu-se no grosso manto que a Dona lhe oferecera, virara-se mais uma vez para nós, acenara em despedida e partira para o seu destino de origem, acabando por desaparecer lá ao fundo entre as árvores e os cerros ondulantes. Os cães ainda latiram algumas vezes, mas o silêncio acabou por envolver definitivamente o campo e seus animais no manto amigo da noite.
(imagens – Google.com)