ALBUFEIRA
Um espelho que reflecte a vida, que passa por nós num segundo (espelho)
Crime em Paralelo com Contraponto Concorrencial
Ficheiros Secretos – Albufeira XXI
(Outros Mundos – T versus ET)
(Saldo Actual: 10€)
“Desde que fomos globalizados deixamos de ser e existir, apenas porque oferecemos a nossa liberdade em troca duma pretensa e graciosa segurança. Só que não percebemos tratar-se da liberdade dos outros. E se no que toca à segurança ainda a poderemos dispensar sujeitando-nos nem que seja à lei da selva e do mais forte, sem liberdade não vamos a lado nenhum: e parados e sem movimento só os animais doentes ou mortos”.
(Em Espera)
Estava eu ligado à rede a actualizar alguns dos meus dados contabilísticos e a verificar algumas notas de encomendas ainda em processamento – aguardava a chegada duma encomenda importante – quando no monitor apareceu um aviso de chegada de uma nova mensagem. Não vinha com identificação visível nem com título atribuído. Mas ao abri-la descobri logo a sua origem: só poderia significar que fora dada a autorização e que lhe comunicavam agora o menu pormenorizado da operação. Sem perder tempo foi buscar o descodificador, enquanto aproveitava para confirmar que a Maria continuava a dormir profundamente: convencera-a a tomar uns analgésicos para ver se melhorava das dores que ultimamente lhe afectavam as costas e até a ajudara um pouco mais, introduzindo-lhe uns calmantes no tratamento para ver se descansava mais um dia e se esquecia de vez a cabeleireira. Dormia profundamente. Com o aparelho traduziu a mensagem: o crime seria praticado num prazo limite de noventa minutos, numa habitação situada na periferia da cidade e estando o alvo devidamente identificado e localizado. O encontro com o executor – que acompanharia nesta missão – far-se-ia no local habitual, partindo ambos e de imediato para a concretização da mesma, finda a qual o executor se desligaria do processo: que como eu sabia terminava muitas das vezes no seu desaparecimento.
“Vou para os lados do parque de campismo levar uma pessoa. Volto já”.
Tinha registado a cena na câmara do meu telemóvel, até para a Maria poder confirmar que era verdade: desde ontem que estava à espera de uma oportunidade para ir ao cabeleireiro.
“Cheguei e o tipo já entrou. Deve faltar pouco. Fica mesmo ao lado do parque”.
Enquanto esperava filmei a paisagem, apanhando ainda o indivíduo a sair e a dirigir-se para mim: pelo visor pude ver que vinha apressado e com muitas partes da sua roupa manchadas de vermelho. Na mão trazia um revólver e uma catana. Pousei a câmara e aguardei.
“Desculpa mas tenho que fazer um pequeno desvio. São só mais uns minutos. Ele esqueceu-se duma coisa”.
Um pouco nervoso o indivíduo pediu desculpa pelo seu aspecto, referindo-se ter virado com a pressa a bacia onde se encontrava o sangue para a cabidela, acabando por ser atingido: a catana e a pistola também tinham sido atingidas pelo sangue da cabidela e quem não ia ficar contente dentro de momentos, era o dono a quem as ia entregar. Olhou para mim e encolheu os ombros. Arrancamos então para o interior.
“O tipo disse agora que eram só cinco minutos. Isto tudo é um bocado esquisito. Mas como já vi tanta coisa, o que quero mesmo é ir-me embora. Um pouco mais de paciência”.
Estava agora em pleno campo, junto duma moradia térrea e já com alguns largos anos de idade, plantada numa das extremidades dum terreno com cerca de dois hectares, aparentemente abandonado mas limpo e bem arranjado. De um dos lados da casa destacava-se uma pequena construção que talvez fosse uma garagem. Nesse momento o indivíduo saiu de casa fez-me sinal e dirigiu-se para a garagem. Entrou e fechou a porta atrás de si.
“Não sei bem onde estou. Não se vê ninguém e o tipo nunca mais sai da garagem. Já passou um quarto de hora e nada. Só ouvi uns pequenos estrondos e umas aves a levantar voo. Devem ser caçadores que adormeceram...E daqui a pouco quem adormece sou eu. O tipo é mesmo estranho”.
O indivíduo saiu de lá como um homem novo. De início nem o reconheci só o fazendo quando ele se aproximou do carro e se me dirigiu: pediu-me para guardar na viatura um saco de viagem que trazia consigo, enquanto ia no instante até casa buscar algo regressando de imediato. Sorriu-se então para mim, enquanto mostrava como agora já se encontrava muito mais apresentável. Virou-se e enquanto ele seguia em passo acelerado para a porta de entrada, vi o estranho objecto suspenso e preso à sua cintura: tinha uma forma alongada estreitando-se numa das suas extremidades, apresentando-se com um aspecto que sugeria um material carregado doutros materiais de menores dimensões incrustados ao longo de toda a superfície, o que o transformava num objecto extremamente belo e estilizado e simultaneamente não deixando de sugerir um artefacto dum qualquer filme de ficção científica. Devia estar a ficar apanhado da cabeça: toda aquela situação o apanhara desprevenido e se pensasse mais claramente, poderia ter muitas interpretações. E se verdadeiramente estivesse num filme, o enredo poderia ser outro, que não o seu. Interrompeu os seus pensamentos, quando a porta da casa se abriu.
“Acho que é agora que estou de regresso. O tipo já fechou tudo e só está a verificar os quadros de entrada. Até já”.
O indivíduo entrou no carro, sentou-se e fechou a porta do seu lado e enquanto reiniciávamos a viagem, olhou para mim e falou. Ainda hesitou uns segundos, mas logo verbalizou as suas actuais inquietações:
“Era um simples mensageiro com algumas funções operativas – atribuídas temporariamente em casos de extrema necessidade – e estava ali no cumprimento duma simples formalidade processual, mas técnica e inadiável”. Aí fiquei um pouco baralhado e comecei a pensar se o indivíduo seria mentalmente equilibrado. “A sociedade para a qual trabalhava não dispunha de qualquer tipo de identificação institucional, nem aqui nem noutro lugar do mundo: tratava-se duma sociedade secreta estabelecida entre entidades internas e externas e o seu objectivo final era a salvaguarda da estabilidade mundial, ambiental, social e económica. A sua história mergulhava profundamente no passado e nas lendas envolvendo Deuses, Alienígenas e outras Entidades Revolucionárias”. Entrei de novo na estrada principal, estava o indivíduo na parte da conversa em que se referia aos extraterrestres: mas o que haveria eu de fazer com um tipo como este e como é que me tinham arranjado esta encomenda? A minha vontade era arrancar logo para casa e deixar o tipo onde quisesse o mais rapidamente possível. Ainda se arriscava mais uma vez a faltar a promessa feita à Maria. Um pouco à frente o indivíduo retomou a conversa. “Esperava que eu compreende-se a sua situação e poderia estar sossegado porque não fizera nada de errado. Dizia-me isso porque me sentia um pouco nervoso, visível no meu rosto suado e nalguma irritação corporal que entretanto ia demonstrando: poderia ter a certeza que não era nenhum demónio ou outro monstro malévolo do outro mundo, disse-me ele sorrindo enquanto me tocava no ombro. A sua mão estava extremamente quente e enquanto o olhava tentando acalmar-me, vi de novo o artefacto preso à sua cintura, mas agora brilhando intensamente em determinadas incrustações. Aí – e sem saber porquê nem tendo consciência disso – o meu corpo começou a tremer, com uns arrepios crescentes a atravessarem-me toda a coluna vertebral e a saírem sob a forma de tremores por todas as extremidades do meu corpo: o que o indivíduo sentiu e pareceu-o deixar alerta. Pediu para parar num café ao lado da estrada e dirigiu-se ao seu interior.
“Já nem sei no que me meti. Pede ao José para ir ter comigo ao cruzamento da bomba de gasolina do tio dele. Passo por lá e fico à espera. Não sei se vou estar aí a tempo de te levar. O tipo já aí vem. Estou feito”.
Vinha acompanhado por mais dois indivíduos bem vestidos e com uma excelente apresentação, sendo o duo constituído por um homem e uma mulher, ele visivelmente mais velho do que ela. Enquanto o meu passageiro se dirigia para o local onde eu me encontrava, o casal desviou-se um pouco mais para a sua direita e encaminhou-se para um grande monovolume de vidros fumados para onde entraram pela porta lateral. Deixaram-na entreaberta. E enquanto via o meu passageiro a aproximar-se da porta direita do carro, ouvi um som vindo da porta da esquerda situada atrás de mim e a partir daí perdi os sentidos: pelo menos não me lembro de nada, dos momentos antes de despertar. Estava agora sentado sozinho no interior da minha viatura com o José já ao meu lado e a abanar-me fortemente tentando acordar-me. Não havia sinal do meu passageiro, nem do monovolume e do casal que nele entrara. Poderia estar a viver um sonho.
“Vou arrancar. O José já se foi embora e acha que eu estou louco e que deveria ir mas é dormir. Nem sabes o que me aconteceu. Depois conto-te. Até já – mesmo”.
Na sua última etapa da viagem de regresso a casa uma das primeiras coisas que viu a passar ao seu lado na estrada, dirigindo-se em sentido contrário ao que agora seguia, foi uma carrinha de apoio da GNR. Mais à frente e no outro sentido do trânsito, uma patrulha da mesma força fazia o que parecia ser uma operação de controlo de viaturas e das suas respectivas cargas. Já perto da rotunda a circulação de trânsito encontrava-se parcialmente bloqueada, com várias carrinhas das forças policiais, dos bombeiros e do INEM, aglomerados numa das suas saídas – logo por coincidência aquela que percorrera momentos antes perto do parque de campismo na companhia do indivíduo misterioso. No pára e arranca vivido pelos condutores nestas ocasiões, acabou por saber por intermédio dum popular que ali permanecia desde o início, que as autoridades tinham encontrado numa casa situada bem no fundo do caminho, o corpo já cadáver de um indivíduo de meia-idade, atingido com dois tiros no coração e decapitado. Nessa altura estremeci e paralisei, bloqueando-me mentalmente com um violento ataque conjunto, de medo e de suores frios; e devo ter ficado branco que nem a cor da cal, pois logo o homem me tentou acalmar afirmando que a polícia já estaria na pista dos culpados e oferecendo-me até uma garrafa de água. Tinha que enviar já uma mensagem à Maria, pois certamente que este caso acabaria por chegar à sua origem e no seu caminho ele seria um dos principais atingidos. Parou na berma e enquanto olhava o cenário próprio dum thriller policial, enviou a mensagem.
“Estou perto da rotunda parado. Houve um crime por estes lados e isto está cheio de polícias. Acho que estou metido numa grande alhada e o melhor é ir ter com eles. O tipo que transportei se calhar está implicado e vê lá tu, fui eu que o trouxe. Chegou um guarda: vou aproveitar. Ligo já”.
Ao princípio o guarda ainda ficou a olhar para mim, ocupado como estava a tentar desobstruir a via de trânsito: olhou para mim, voltou a olhar para o trânsito e ainda um pouco desconfiado lá me levou até ao comandante. Custou um pouco a chegar junto dele, mas feitas as apresentações e indicado o motivo da minha presença, não mais me largou: olhando atentamente para o meu carro confirmara em poucos segundos o modelo de automóvel e o formato dos seus pneus, muito semelhantes àqueles que uma viatura similar faria num caminho de terra como aquele onde se encontravam e que ia dar à casa da vítima – e que neste caso eram nalguns sectores ainda bem visíveis e de fácil comparação. Levou-me até ao carro de apoio da GNR – que ali estava instalado como um gabinete de crise – e no seu interior dei o meu testemunho, o qual ele ouviu atentamente e sem nunca me interromper. Sensivelmente a meio do meu relato fomos interrompidos por um oficial que pedindo desculpa se dirigiu ao seu superior e lhe segredou algo ao ouvido. Muito interessado com o que lhe era relatado o comandante virou-se para mim e pediu uns minutos de escusa, aos quais eu acedi aproveitando para ligar à Maria. Como não atendeu não tive remédio senão enviar-lhe nova mensagem e esperar que ela desse sinais de vida: não via como é que tão cedo me iria safar disto, nem como iria identificar os seus verdadeiros suspeitos, já que nunca os vira antes, nem os seus nomes sabia. Que desastre! E ao meter a sua mão no casaco encontrou uma bolsa.
“Espero que acreditem em mim. Estive a pensar nisto tudo e no fundo até tenho as mensagens que te enviei e as imagens que registei, que poderão em último caso servir para a minha defesa. Mas o que tenho eu a ver com isto? Estava no café descansado a apanhar Sol e logo me tinha que aparecer este tipo. E os tipos do café ainda me convenceram: que burro! Acho que o melhor é esperares em casa. Não sei quando termina. A vida tem cada coisa que até parece bruxedo”.
O comandante regressou pensativo e com uma cara um pouco esquisita – parecia intrigado com qualquer coisa, provavelmente muito pouco habitual para ele: mas mal me viu pareceu abstrair-se desse facto, pedindo-me educadamente para continuar. Assim fiz e interrompido aqui e ali por um ou outro curto comentário, vinte minutos depois tinha acabado. Permanecemos uns segundos em silêncio, com ele ainda a digerir a última parte do meu relato em que perdia sem saber como ou porquê os sentidos, afirmando o comandante entre duas risadas dirigidas mas cordiais, que se fosse o caso tal não seria um grande álibi. Para mim claro. Mas a partir daí falou ele pedindo ao restante pessoal que o acompanhava na missão para ficar comigo sozinho no interior do veículo de apoio. O que ele disse deixou-me surpreso, assustado e receoso. Pedi-lhe para ir beber um copo de água, liguei sem o fazer notar o gravador do telemóvel e voltei a sentar-me. Estava pronto para o que aí vinha e que poderia ditar o meu futuro: a gravação tinha-se iniciado, acompanhada em simultâneo pela mensagem prévia de aviso (para o destinatário).
“Gravação automática: aviso de início/procedimentos habituais/nível5”
Tinha ocorrido um acidente extremamente grave na Via Rápida que atravessava longitudinalmente toda a região onde se encontravam, tendo-se verificado a queda em plena via de um dos pórticos nela instalada perto dum nó rodoviário muito importante e movimentado, o qual provocara um violento choque de viaturas em cadeia, causando vários feridos e pelo menos três mortos já confirmados: precisamente os ocupantes de um monovolume, em tudo idêntico ao descrito no meu relato. O registo de passagem confirmava a entrada da viatura num nó situado nas proximidades do local onde eu afirmava ter perdido os sentidos, com o próprio GPS da viatura a confirmá-lo e aos registos quilométricos e temporais. Não tinham encontrado até agora nenhum indício da presença de armas junto dos três indivíduos calcinados – dois homens e uma mulher mas dadas as altas temperaturas atingidas durante a explosão e no decorrer do incêndio que se seguiu, certamente pouco mais poderiam aí encontrar. Sorridente e aparentemente satisfeito, ainda teve tempo para acrescentar que alguns populares presentes no local aquando do acidente, teriam afirmado que tudo teria sido provocado por um raio que teria subitamente atravessado o céu de uma ponta à outra do horizonte, o qual por sua vez teria provocado várias descargas sobre a zona onde estariam a passar, indo uma delas atingir a Via Rápida e levando à queda do dito pórtico. Acrescentavam ainda – mas duma forma receosa e incrédula, face à sua impossibilidade física – que não reconheciam um dos automóveis que se encontrava no meio dos destroços junto do monovolume, dado nunca o terem avistado no início do choque em cadeia, nem em qualquer momento subsequente. Se lá estivesse, com ele iriam todos ao teste do balão! Mandou-me então embora e que estivesse descansado: só teria que comparecer o mais breve possível no posto da guarda, para assinar o relatório da ocorrência e me livrar de tudo isto. Segundo ele eu tinha tido uma sorte tremenda em ainda ali estar, já que ainda me encontrava vivo e bem de saúde: na maioria destes casos os primeiros elementos nunca se safavam. Não sabendo porquê engoli em seco e fui-me então despedir dele. Cumprimentamo-nos, desejamos o melhor dos melhores para cada um e separamo-nos com mais um aperto de mão. Já com a porta de saída entreaberta, chamou-me e acrescentou: já agora pedia-lhe por amizade e solidariedade que deixasse ficar comigo o seu telemóvel e encarasse tudo isto e para si como se nunca tivesse existido...pela minha parte não tenho memória do que não me interessa e pretendo apenas manter os equilíbrios...como as armas utilizadas em crimes, que posteriormente têm que ser destruídas. Fiquei parado até digerir completamente a sua mensagem: então ele virou-me as costas e foi-se sentar. Eu saí e finalmente fui para casa.
“Safei-me. Nem acredito – na verdadeira acepção da palavra. Só tenho que festejar. Estou já aí”.
O tempo tem estado melhor nos últimos dias após o temporal que atravessou a região na semana anterior: já podemos sair de casa e ir dar uma volta até ao café. Assim é bom estar, aproveitar e viver.
(Em Espera)
Partindo do princípio de que era humanamente impossível estar do lado de outras espécies alienígenas (por estrangeiras) ainda por cima vindas de outros planetas (muito distantes), acho que a minha posição definitiva sobre “que lado tomar”, tinha sido a mais lógica e compreensível decisão: nunca poderia trair a minha espécie, mas por outro lado poderia utilizar o argumento dos outros, em meu exclusivo benefício. E foi o que fiz:
Precisava dum elemento de que me pudesse descartar rapidamente após a conclusão do trabalho a que me tinha proposto, mas que ao mesmo tempo conseguisse criar o ambiente e as condições necessárias para a construção dum cenário realista e acima de tudo credível, que facilitasse a sua eliminação e subsequente acusação. E lá encontrara Ivan e os seus dois primos, mercenários de qualquer tipo de guerra por qualquer quantia de dinheiro e agora caídos em desgraça e transformados em traidores fugidos das suas próprias terras em guerra, por eles mesmos promovida e transformada em negócio, aqui desempregados, abandonados e no momento sem grandes fundos: foi fácil comprá-los com um pequeno adiantamento e a promessa dum grande golpe a realizar muito em breve. E a ocasião surgiu três dias depois, dando-me o tempo suficiente para já ter tudo preparado e arrancar de imediato e em paralelo com o meu plano. Com o telemóvel na mão dirigi-me para o café;
Quanto à missão correu tudo como previamente planeado com a colaboração daquele que poderia vir a ser o meu grande álibi o telemóvel, da graciosa sonolência da testemunha adormecida em minha casa a Maria e até dos três estrangeiros que comigo colaboraram, assumindo em seu nome toda a culpa do odioso crime ocorrido e morrendo juntamente com o seu próprio testemunho. O alvo fora abatido conforme o superiormente solicitado e simultaneamente fizera talvez o golpe da minha vida: há tempos que as riquezas do indivíduo eram comentadas por todo o lado em voz baixa mas interessada, mas nunca ninguém as tinha visto ou encontrado, até ao dia em que por mero acidente e numa pesquisa que depois me levaria a esta acção, o vi com um conjunto de artefactos extremamente brilhantes e contrastantes e que o deixava visivelmente deliciado com a sua extrema beleza e forte impacto mental, como se estivesse perante outras realidades ou outros mundos. Tinha que possuir aquilo. E consegui-o na execução dum plano perfeito. Só mesmo a interpelação tardia do comandante policial me perturbara: naquele momento e por qualquer razão ele não actuara e pactuara, o que significava que eu estaria a partir de agora muito mais atento aos seus movimentos, pois nestes assuntos seriamos sempre cobradores se não quiséssemos passar por mortos. Então o telemóvel tocou: na mensagem a Maria pedia-me para ir já ter com ela ao cabeleireiro, pois já estava despachada.
“Já estou no carro: é só ligar e arrancar e estou aí enquanto o diabo esfrega o olho”.
Do outro lado da cidade ouviu-se uma violenta explosão, levando o Comandante a olhar sorridente para a sua bem apresentada e penteada acompanhante, que lhe retribuiu alegre e superiormente a atenção com um enorme beijo sobre a face direita. Apontou em direcção à coluna de fumo que se erguia ao fundo da avenida, deixou-a à porta de casa e ainda teve tempo para se justificar: “afinal de contas tenho que ir tomar conta da ocorrência e desde já aceita os meus pêsames”.
(imagens – Web)