ALBUFEIRA
Um espelho que reflecte a vida, que passa por nós num segundo (espelho)
Pete Seeger (1919/2014)
“Little boxes on the hillside
Little boxes made of ticky tacky
Little boxes
Little boxes
Little boxes all the same”
(Pete Seeger)
Conheci melhor a sua música a partir da década de setenta – especialmente após o 25 de Abril de 1974 – já ele era há mais de uma dúzia de anos uma das faces de protesto nos Estados Unidos da América, contra a guerra e a favor dos direitos civis.
Associo a sua imagem aos tempos do combate final contra o situacionismo do Estado Novo, à luta dos emigrantes na Europa e à dos combatentes nas colónias e até hoje em dia e em pleno século XXI à nova fuga dos nossos filhos rumo ao desconhecido por condenação institucional ao exílio.
E á minha juventude cheia de esperança e de ilusões nos dias prometidos que aí vinham, em que ainda pensava que o Homem era a salvação e os homens um instrumento: esquecendo-me que no meio e fazendo prevalecer o poder do homem sobre o Homem existia o poder das massas, instrumentalizado por uma hierarquia psicótica oficialmente normalizada e duma forma contra-natura globalizada.
Uma vida inteira ao lado dos músicos e dos seus instrumentos, dos escravos e dos trabalhadores e de todos os outros explorados do mundo
Nascido em Nova Iorque há 94 anos (fazia 95 anos a 3 de Maio), Peter Seeger foi um dos principais e mais populares intérpretes e representantes da música folclórica norte-americana. Partiu no passado dia 27 de Janeiro.
Popularizado na década de sessenta pelo seu apoio ao Movimento dos Direitos Civis com a canção espiritual “We Shall Overcame”, manteve até ao fim da sua vida o apoio a todas as causas e lutas dos mais desfavorecidos, incluindo nesse grupo todos os trabalhadores e outros cidadãos também explorados. Como o fez ainda não há muito tempo com o seu apoio e participação na campanha “Occupy Wall Street”.
Não posso aqui deixar de mencionar um daqueles cidadãos anónimos (neste caso português e residindo na época nos Carvalhos/Vila Nova de Gaia) que me apresentou o músico e revolucionário norte-americano Peter Seeger: Arnaldo Mota. Jovem desertor do exército colonial português, cidadão com bilhete de identidade e vivendo sob as ordens de Américo Tomás e de Marcelo Caetano – Salazar caíra da cadeira – filho de famílias humildes e trabalhadoras fugido da guerra (para a Bélgica), finalmente regressado a Portugal por volta do 25 de Abril – talvez arrependido pouco depois: um dos muitos jovens que inicialmente Portugal desprezou, que de seguida ignorou e que depois esqueceu.
Pete Seeger e a luta pelos direitos humanos
(Jornal Sol – 01.02.2014)
Pete Seeger morreu aos 94 anos, em Nova Iorque, de causas naturais. Activista dos direitos cívicos, usou a música para expor os males da América e eternizou ‘We Shall Overcome’ como o hino da luta dos negros nos Estados Unidos. Na memória colectiva deixa a imagem de um dos mais relevantes impulsionadores da folk americana, determinante na ascensão de Bob Dylan.
Há dois anos, já nonagenário, Peter Seeger juntou o seu nome às manifestações Occupy Wall Street, em Nova Iorque, movimento de protesto contra a desigualdade económica e social mundial. Ao lado dos milhares de populares que ocuparam Zuccotti Park, o distrito financeiro de Manhattan, o músico folk soltou a voz para cantar ‘We Shall Overcome’ (’Venceremos’), tema que se tornou o hino dos movimentos cívicos afro-americanos nos anos 50 e 60. Este episódio em frente à bolsa de Nova Iorque, no final de 2011, é apenas mais um na história de um homem que fez da luta pelos direitos humanos uma batalha pessoal, mas revela bem como Peter Seeger viveu intensamente as suas convicções políticas.
Durante os seus 94 anos cantou contra a ditadura de Hitler, opôs-se à utilização da energia nuclear, foi incluído na lista negra do McCarthismo por ser assumidamente comunista, apoiou Martin Luther King, juntou-se aos protestos contra a guerra do Vietname, ao lado de ambientalistas denunciou o aquecimento global e, mais recentemente, criticou o poder económico. Tudo isto sempre com a música por perto. Para ‘Pete’ Seeger a folk e as suas obrigações cívicas eram inseparáveis e a música servia para denunciar os males do mundo e desencadear acções políticas. Era, por isso, como escreveu esta semana o Los Angeles Times, considerado por muitos “a consciência da América”.
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(imagens – Web)