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Porto – Em Triste Transformação

Quarta-feira, 14.09.16

Podendo ser Decomposição

 

Num país pretensamente inculto (previa e intencionalmente assim definido pelas suas elites) e completamente desorientado (com o povo contando o resultado do seu trabalho e comparando-o com o seu antigo estatuto de escravo) por onde passaram como se fosse um Flash os Ideais de três grandes Revoluções: a Agrária, a Industrial e a dos Serviços.

 

No entanto nunca interiorizando nenhuma delas mas sempre privilegiando a última (pela falsa novidade e na verdade pelo dinheiro fácil a receber).

 

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Porto – Cais de embarque da Ribeira

(como visto a partir do cais de Gaia)

 

O Porto do século XIX acabou: se no século seguinte algumas das suas estruturas e características básicas ainda refletiam as virtualidades da Revolucionária Sociedade Industrial – período durante o qual a mão-de-obra se deslocou maciçamente do campo para a sociedade abandonando definitivamente todas as esperanças depositadas na já ultrapassada Revolução Agrícola (desestruturada por uma nova centralização – a Globalização) – já no caso do século XXI com o abandono progressivo do desenvolvimento Industrial e a perda comercial (irreparável por contínua) no sector Agrícola, todo o cenário tem vindo a mudar (mantendo-se o aspeto arquitetónico numa base minimalista – aproveitando-se o que já antes existia – melhorando-se e decorando-se o mesmo como uma árvore de Natal – com pessoas, barquinhos e helicópteros – e tentando-se alterar radicalmente a sua base populacional e funcional – transformando tudo em Serviços dirigidos para uma única área; Hotelaria e Restauração).

 

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Gaia – A outra margem do Douro

(Caves do Vinho do Porto e Restauração)

 

Para quem se tenta escapar da loucura delirante de Agosto (dizem que provocada pelo calor) instalada neste período do ano no território sul de Portugal (mais precisamente nas praias cheias e bem quentinhas do Algarve), uma verdadeira surpresa (de nos deixar paralisados e até de boca aberta) uma assumida deceção (deixando-nos prostrados e de lágrimas nos olhos): num cenário desenquadrado e como se o Porto fosse um shopping.

 

Com boa comida e bebida e o português a Souvenir (as únicas três coisas de que o visitante se lembra), obediente e servil e de caracter bem doméstico – ontem matando o porco com uma facada no pescoço (e nem sequer se tendo no mínimo a 4ªclasse), agora colocando-o à mesa enfeitado e com laranja (mas sempre acompanhado pelo selo de garantia – e não só para o porco como para todos os outros Tôs).

 

Observando-se claramente duas ondas gigantes e bem distintas descendo compactas e a velocidades alucinantes em direção às duas margens do rio Douro (com uma horda de bárbaros vindos de norte e outra vinda do sul), esmagando-se violentamente e de frente sobre o leito aqui mais estreito do rio Douro e acabando por se desintegrar na sua superfície em múltiplos objetos sulcando o ar e a água com formas tão diferenciadas como barcos, helicópteros e até mergulhadores.

 

Fazendo-me recordar a minha infância, as noites de diversão no Palácio de Cristal (de onde também se podia observar mas mais à distância o rio Douro) e as barracas de frango e da sardinha assada. Na altura também no Verão mas ainda sem Gourmet de adição. E se há 40 anos atrás achava que aqueles que tinham destruído as grandes cidades portuguesas se tinham então deslocado para o Algarve (para continuarem aí a sua obra de rapina paisagística e ambiental), agora são de novo as grandes cidades já doentes e em decadência (não existe inovação apenas um falso investimento) a serem novamente atingidas e massacradas (e sempre com o mesmo modelo), mas agora (e espantemo-nos) pelos filhos do cada vez menor grupo dos poucos sobreviventes.

 

(imagens: Agosto de 2016/Produções Anormais)

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publicado por Produções Anormais - Albufeira às 22:05

PORTO

Quinta-feira, 08.11.12

Há cinquenta anos a imagem do Porto já era esta. Hoje ninguém poderá negar a beleza desta imagem, mas também não poderão esquecer que atrás deste mundo colorido, ainda existe um outro mundo com pessoas esquecidas e desprezadas e com uma vida de sacrifícios e toda de preto e sem um pouco de branco compreensivo e solidário.

 

O Porto seria mais belo se tivessem estimado melhor o seu povo trabalhador

 

O Porto é a cidade onde nasci, frequentei a primária/1.ºciclo e conclui o preparatório/2.ºciclo. Vivi durante estes anos numa habitação situada na Rua do Bonfim – perto da Igreja – e ainda me lembro de ver através da varanda do 1.ºandar – ou então do sótão onde eram os quartos das crianças – o majestoso Rio Douro perto da zona do Freixo, correndo carregado de água entre as suas margens e com a verdejante serra do outro lado, carregada de um arvoredo cheio de vida e de fauna, como pano de fundo de um maravilhoso quadro de criança. Muitas vezes me punha a observar aquela bela e misteriosa terra que envolvia a cidade, cercando um intrincado conjunto de casas amontoadas constituintes desta urbe e que como amante dela me parecia tão perto de mim – à distância de um olhar – mas ao mesmo tempo tão longe fisicamente, não só por me parecer inalcançável devido à distância e a não poder lá estar, mas porque o rio se armava em seu defensor e não me deixava lá chegar. O rio era sempre a minha referência geográfica e do sótão da casa dos meus avós maternos, muitas vezes passava algum tempo a observá-lo, através daquela a que eu chamei em criança “A Janelinha do Douro”. Muitas recordações me ficaram ainda da minha infância, como as fortes trovoadas de Inverno que faziam a casa estremecer – e o medo que elas nos provocavam ao serem acompanhadas por relâmpagos como já não existem –, os incêndios que mais tarde começaram a atingir a serra talvez por interesses imobiliários e ainda a azáfama da vida e dos negócios das pessoas, que trabalhando sem parar até anoitecer, procuravam uma vida melhor do que aquela que tinham na altura e do qual o estado novo pouco se importava.

 

Nas margens do Rio Douro o casaria já começava a crescer e a subir vertiginosamente, mesmo nas suas margens mais perigosas e inclinadas, aproximando-se rapidamente das zonas da Ribeira – e também do lado de Gaia – e colocando-se frente-a-frente aos barcos rebelos e aos armazéns ligados ao florescente comércio de vinhos, de que o Vinho do Porto era a sua excelência, por interferência e interesse de mercado dos nossos amigos Ingleses. Isto tudo porque ainda me lembro da passagem de carro sobre o tabuleiro superior da Ponte de D. Luís, necessário para se poder atingir a outra margem do Rio Douro e a partir daí poder descobrir o mundo que se estenderia para lá dela e que nos provocava sempre e em criança, um misto de receio e fascínio – pela sua elevada e inusual altura – que nos transportava para um mundo de vertigens, perigo e aventura, ao mesmo tempo conjugado com o maravilhoso espetáculo de assistir de cá de cima – do céu – os carrinhos de brincar que lá em baixo faziam fila pela marginal até ao tabuleiro inferior da ponte, sempre a andarem e sem se verem pessoas, como numa pista de carrinhos de plástico, em que os condutores seriamos nós: aqui seria a nossa imaginação, a criar este mundo de brincar.

 

(imagem – dipity.com)

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publicado por Produções Anormais - Albufeira às 14:11