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Um Dia na Vida de Esteves Macuin – 2/5

Quinta-feira, 11.12.14

Novos Ficheiros Secretos – Albufeira XXI
(Histórias do Outro Lado)

 

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Um Objectivo Simbólico e Decisivo

 

A ementa tinha sido espectacular: como entrada tínhamos pedido Amêijoas à Bolhão Pato (fresquinhas e com um cheirinho e sabor de chorar por mais); como prato principal todos pedimos peixe (um prato mais leve e fácil de digerir, além de sempre saboroso) – um Cherne e um Linguado grelhado, um Polvo à Lagareiro e as imprescindíveis e inigualáveis Sardinhas Assadas (especialmente pedidas por Esteves Macuin, que no entanto não dispensou como complemento uns Peixinhos da Horta). Com tudo isto muito bem regado por um vinho de reserva da região de Palmela e terminando em perfeição com uma sobremesa bem doce e gostosa composta por doces conventuais (e de um licor de Amêndoa Amarga). E como previamente decidido às duas da tarde e já bem alimentados, lá se dirigiram para o Banco de Portugal.

 

Chegados ao último cruzamento da Rua do Comércio localizado mesmo antes do quarteirão onde estava instalada a sede do Banco de Portugal, Esteves Macuin juntou-nos todos à sua volta e esteve durante alguns minutos a esclarecer-nos dos seus próximos passos. Ficou combinado que Jaime Dine e João Uaine deslocar-se-iam no carro até à estação de metro da gare do Oriente, onde deveriam aguardar a nossa chegada exactamente às três e meia da tarde. Após o assalto faríamos a ligação Chiado/Oriente utilizando a linha verde e vermelha, esperando levar 15 minutos para fazer o trajecto a pé do banco até ao metro e mais 30 minutos para a viagem até ao nosso encontro na gare do Oriente. Sobravam assim 10 minutos para o assalto. E como anteriormente combinado os dois partiram em direcção ao seu carro, enquanto eu me ia colocar nas traseiras do edifício do banco, à espera do regresso de Esteves Macuin. Daí iríamos para o metro do Chiado.

 

Esteves Macuin encontrava-se à porta do Banco de Portugal às 14:35. A segurança em torno do edifício era bem visível e um pouco anormal (face ao número de guardas aí presentes), o que poderia ter sido provocado pelo reboliço por eles antes causado, à sua chegada à Praça do Comércio. Mas como estava vestido como um verdadeiro gentleman à entrada nenhum dos seguranças o incomodou e até foram todos muito solícitos em abrir-lhe a porta, cumprimentando-o sempre muito educadamente. No hall dois guardas fortemente armados mantinham a segurança no interior do banco enquanto um terceiro não parava de falar através do seu comunicador. Pegou então no Simulador, percorreu o seu menu de execução e escolheu o programa adequado: primeiro neutralizou-lhes todas as comunicações, deitou-lhes abaixo toda a grelha eléctrica (incluindo os geradores de apoio) e bloqueou-lhes todos os aparelhos electrónicos. Com o edifício integralmente paralisado e totalmente aberto a todo o tipo de intrusões vindas do exterior (possíveis de concretizar sem qualquer tipo de perigo para a sua segurança), Esteves Macuin passou então à execução do seu plano: ainda tinha nove minutos.

 

Do bolso retirou duas pistolas (uma parecendo de grande calibre) e meia dúzia de pequenas granadas: as duas armas disparavam projécteis sólidos e impactantes (provavelmente um pouco dolorosos), enquanto que as seis granadas (gasosas ou líquidas) eram um brinde suplementar vindo da sua parte brincalhona (e que provavelmente o fariam apenas rir e divertir-se). Ao minuto preciso (-8) os três foguetes de pirotecnia explodiram em pleno ar (a quase vinte metros de altura), provocando o surgimento de uma pequena onda de choque (que varreu toda a zona do banco), acompanhada por uma ligeira vibração e um estrondo bem audível. E no mesmo espaço o tempo parou.

 

Projectou todo o trajecto até ao cofre do banco e neutralizou o efeito em todos os sectores nele englobados. Queria expor publicamente a sua grande emoção e orgulho por ali estar e partilhar. Como tal, o cenário teria que ser absoluta e indubitavelmente mente real – de modo a assim expor todo o seu empenho e verdade, em assumir tudo aquilo como seu. E para o conseguir teria que usufruir de todas as sensações e que desfrutar de todos os seus prazeres. Trinta segundos depois apareceram três seguranças que o olharam e se puseram aos gritos. Do elevador à sua direita saíram mais dois funcionários e uma bela executiva. O elevador da esquerda ainda se encontrava em movimento. Sacou logo da primeira arma e disparou uma rápida rajada sobre os seguranças. Desintegraram-se instantaneamente sob uma violenta explosão de luz. E enquanto o outro trio se refazia do clarão que quase os cegara, o outro elevador chegou, parou e a porta abriu-se. Esteves Macuin estava mesmo a divertir-se. Pegou em metade das granadas e lançou-as para o interior do elevador. Ouviu-se então um ligeiro click seguido por um pequeno silvo e um fumo não muito espesso mas bastante doce, agradável e intrusivo começou a sair para o exterior. De início fez-se um curto silêncio repentinamente seguido por uns quantos gritos emitidos por umas quantas pessoas em delírio que iam saindo a correr pela porta do elevador: e enquanto ia descartando os últimos cartuchos da sua primeira arma sobre estes loucos (de desejo) em fuga incontrolada, ainda antes da concretização da sua desintegração ia aproveitando a ocasião para ir observando os corpos esbeltos e firmes destes jovens (de ambos os sexos) ardentes e fogosos, que sem saberem porquê e desde quando, se perseguiam em exercícios e práticas amorosas que inevitavelmente terminariam no penetrante e de partilha total acto sexual. Desmultiplicado o cenário (a primeira rajada enviara os seguranças para os WC instalados na cave, enquanto a segunda fora apanhar os dois homens e as duas mulheres em pleno coito não interrompido, nos sofás do escritório do superior hierárquico entre ambos) e continuou como planeado: ainda tinha 7 minutos. Virou-se então para a sua direita e optou ir pelas escadas. Mas para tal teria ainda que tratar do outro trio de funcionários. Estavam de olhos esbugalhados e de boca escancarada a olhar como que hipnotizados para a frente. Nem era bem para ele, mas para tudo o que se tinha passado naquele pequeno espaço mas que agora não parecia existir ou sequer ter existido. Talvez imaginado.

 

Colocou na mão de cada um deles uma das três granadas restantes, entregou-lhes as respectivas instruções de utilização e despedindo-se educadamente de cada um deles desejou-lhes as maiores felicidades. Ainda tocou nos firmes seios da jovem brasileira, aproveitando uma ligeira rotação de receio e de curiosidade dos músculos do seu pescoço, que com este movimento lento e silencioso mais lhe realçaram o perfil já por si enorme (por intenso) e provocador (de desejo). Subiu pensativamente as escadas. Com o tempo parado ou a andar (sendo o Espaço a única referência paramétrica real, o Tempo como parâmetro abstracto só vem trazer confusão) a verdade é que ainda dispunha de cinco minutos quando se colocou à frente da porta da enorme sala onde se encontrava o cofre-forte. No seu interior ouviam-se por vezes algumas vozes e ruídos de passos leves e apressados. E então Esteves Macuin disse bem alto e demonstrando firmeza: “Dou-vos um minuto para saírem todos ou faço explodir tudo isto”. Utilizando a sua segunda pistola disparou uma curta rajada sobre a pesada porta da sala, que explodiu imediatamente em chamas, fazendo cair uma grande parte da parede que a envolvia e apoiava. No meio de gritos e de fumo intenso chegavam os primeiros disparos vindos do interior da sala. E gritando “Tiro (e não roubo) aos Ricos para Dar (e não pagar) aos Pobres”, Esteves Macuin colocou a sua arma em função de disparo de carga única e carregou no gatilho. Estavam todos estendidos e como que adormecidos quando entrou na sala agora silenciosa e se dirigiu calmamente ao cofre-forte atravessando a parede e transportando-se para o seu interior. Identificou, escolheu e guardou tudo o que pretendia. À saída deixou um bilhete de despedida indo-se então encontrar com o seu amigo que o esperava nas traseiras da sede do banco. Pelas 14:45 já iam a caminho do metro do Chiado e encontravam-se prestes a concluir a segunda etapa de Esteves Macuin.

 

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Nave Subversiva em espírito de missão da senadora Macarti

 

Passava pouco tempo do meio-dia quando a campainha da casa em Albufeira tocou e a minha filha Gregoriana foi ver à porta quem era. Logo atrás ia Peque. Ao abrir a porta Gregoriana deparou-se com dois homens rodeando uma mulher, todos parecendo relativamente jovens e apresentando-se muito bem vestidos e trazendo-lhe logo à cabeça a lembrança de que só poderiam ser divulgadores de mais alguma religião. E com a hora de almoço a chegar e todos os problemas por que agora passava, não lhe apetecia mesmo nada ter que aturar mais aquilo. Ainda se riu um bocado quando o seu cão Peque se aproximou mais da porta e começou a rosnar para eles (chegando mesmo a mostrar os seus dentes antes de o ter que puxar para trás), mas logo perdeu o riso e o sorriso quando os Religiosos insistiram mais uma vez recusando-se a partir. A mulher virou-se sequencialmente para a sua esquerda e para a sua direita, dirigiu-se verbalmente a cada um dos homens que a ladeavam e de imediato estes consciencializaram-se ficando hirtos e recuando três passos de imediato. Pareciam tensos. Quando Gregoriana reparou já estavam todos instalados na sala, com a mulher sentada num sofá individual colocado mesmo à sua frente e com os dois homens a guardarem à distância de uma porta o seu cão Peque (preso na cozinha).

 

Apresentou-se como Josefa Macarti. E declarou-se conhecedora de tudo o que até aí sucedera. Ou quase tudo. Já vinha com um atraso para ela considerado inacreditável e inadmissível de doze horas (que em definitivo prejudicaria a resolução do problema que ali a colocava) – facto esse do qual já responsabilizara directamente os seus funcionários de apoio – e se por um lado existia uma zona de penumbra com a mesma duração e sem informações relevantes (ou mesmo nenhumas), em sentido contrário as últimas actualizações recolhidas apontavam para um cenário activo e extremamente inconveniente: não aceitável. Fora por um mero acaso que o dossier de Esteves Macuin lhe caíra em mãos, já o processo ia em andamento e com o arguido já activo intervindo sobre o terreno. A mensagem enviada meio ciclo antes tinha passado despercebida na última actualização de comunicações, só sendo recuperada algum tempo depois, por detecção de uma inadaptação do conteúdo ao código de segurança utilizado. Só que tendo-se já passado mais de metade desse intervalo de tempo e devido à urgência de acção e de intervenção que este inopinado acontecimento impunha, o Conselho Intermédio logo ali a nomeara incumbindo-a da missão. Só tivera que aproveitar o transporte que a nave portal O Subversivo lhe proporcionava.

 

Chamou a si os dois homens que a acompanhavam, comunicando-lhes algo de imperceptível e entregando-lhes um aparelho semelhante a um portátil, que desde que a vira transportava consigo. O cão não dava sinais de vida. E durante trinta minutos (espaço de tempo que pareceu levar uma eternidade a passar) Gregoriana ficou totalmente paralisada (praticamente sem um único dedo poder mexer), limitando-se a olhar fixamente para a imagem de Josefa Macarti, completamente estática e parecendo ”estar a emitir”. Se estivesse a participar num elenco de um filme de ficção científica e fosse colocada perante um cenário como o que estava agora a presenciar, jamais colocaria uma única dúvida na sua total crença na teoria de que ali não estava a mulher estranha que antes se apresentara, mas aparentemente um seu holograma (vazio): a parte activa estaria noutro lugar. Por volta da uma da tarde a minha cabeça pareceu andar à roda, apoiei-me no braço do sofá e tudo voltou à normalidade: Gregoriana endireitou-se no sofá, Josefa Macarti olhou de novo para ela e então os outros dois entraram de novo dirigindo-se para a cozinha. Abriram a porta e Peque saiu de lá a correr. Tinha estado a comer e lambia a boca todo satisfeito. Não rosnou e não mais ligou aos estranhos. Já passava da uma da tarde. Então sem nada dizer Josefa Macarti abandonou a casa, levando consigo um dos seus funcionários. O outro deixou-se ficar para trás convidando delicadamente Gregoriana a almoçar.

 

Josefa Macarti dirigiu-se ao veículo que a esperava à porta de casa e enquanto ainda entrava, pediu mais informações actualizadas e detalhadas: tinha havido um grande alvoroço na zona baixa da capital (durante quase uma hora), mas a partir das 13:00 tinham perdido misteriosamente o rasto do arguido e dos seus cúmplices. Ninguém os vira nas ruas, o que poderia significar que estariam escondidos nalgum local secreto e de coordenadas para já desconhecidas. Pôs os técnicos a trabalharem nisso e dirigiu-se para Lisboa. De modo a não se expor em demasia no terreno, fosse a episódicos e inesperados elementos actuando internamente ou mesmo à curiosidade excessiva e contraproducente que pudesse vir de sectores críticos habitando o exterior, recorreu a uma simples viagem de cruzeiro que a colocaria na capital às duas da tarde. Imobilizaram o seu veículo perto da zona da Gare do Oriente e começaram o exercício intensivo de detecção: Esteves Macuin tinha colocado no interior do seu corpo e num local indetectável para o mesmo um pequeno aparelho de localização tipo GPS, que na execução do seu amplo e diversificado menu tanto podia permitir a sua localização como até estabelecer ligações de comunicação entre as partes. Mesmo que Esteves Macuin tivesse fortalecido as suas redes de protecção tentando manter-se escondido, existiria sempre a hipótese de se encontrar próximo ou então de num impulso este activar de novo o seu Simulador pessoal. Só restava mesmo aguardar pacientemente o desenrolar dos acontecimentos, já que o detector de partículas continuava a indicar uma carga excessiva de alguns elementos raros (externos) inexistentes na região. Esteves Macuin estaria por perto e mais cedo ou mais tarde ter-se-ia que manifestar. Mas sob o olhar inquisidor e cada vez mais impaciente da Senadora o técnico de comunicações já suave sem parar. Já passavam uns minutos das duas e meia quando ouviram ao longe uns foguetes a rebentar. Aí ficaram alertas – nunca se sabia!

 

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Oriente – começando com uma fuga e retornando às origens

 

Chegamos pouco antes das quinze e trinta. O Porsche 911 Carrera 4 GTS estacionado no parque, era bem visível do local onde nos encontrávamos. No seu interior Jaime Dine fumava tranquilamente um cigarro, enquanto João Uaine acabado de nos ver se dirigia na nossa direcção. Foram os três até um snack-bar aí situado: Esteves queria estar a sós por um momento deslocando-se até à casa de banho. E no regresso mostrando alguma preocupação, chamou-nos para um canto já no exterior e apontando para o caso informou-nos que tínhamos rapidamente de partir. Desbloqueara (por descarga de consciência e talvez por algum receio) a barreira de protecção e imediatamente a luz de presença ficara vermelha: o que significava que já estavam no seu alcance e pior do que isso a menos de 1.500 metros de distância. Olharam em redor com muita atenção e correram apressados até ao carro de Jaime Dine. Só que não cabiam todos. Mesmo assim dois deles amontoaram-se meios prensados (e mal podendo respirar) no minúsculo espaço traseiro do automóvel e com Jaime Dine no comando e tendo como co-piloto Esteves Macuin, arrancaram a grande velocidade rumo à Auto-Estrada do Norte. Atrás deles Josefa Macarti não perdera um único segundo e já lançara os seus agentes no terreno: em função dos parâmetros recebidos e dos sucessivos acontecimentos que tinham vindo a provocar nestas últimas horas, o seu simulador fizera uma projecção factual dos próximos episódios (tendo sempre em consideração a dimensão cultural e civilizacional do arguido), o qual apontava inequivocamente para um só destino – o local onde em criança fora por eles abduzido.

 

Percorreram o trajecto até à cidade em pouco mais de uma hora, sem nunca se depararem com grandes constrangimentos de trânsito ou qualquer outro tipo de caso inesperado ou difícil, chegando tranquilamente e muito devagar ao centro da localidade eram cerca de 16h 30mn. Pararam num enorme parque cheio de árvores, reunindo-se todos debaixo de um grupo de jovens pinheiros e sentando-nos nos bancos que as mesmas árvores protegiam (pretensamente do Sol). Poucos minutos depois Esteves Macuin levantou-se, sentou-se tranquilamente na relva, chamou os três até si e muito sucintamente explicou-lhes a terceira fase. Por essa altura Josefa Macarti fazia-se teletransportar para o interior da Capelinha das Aparições, reaparecendo no preciso local onde se encontrava a árvore sobre a qual a sua nave aterrara, noventa e sete anos antes. Com a estátua da santa a ser projectada lateralmente e sendo substituída pela estranha e misteriosa Josefa Macarti. E aí começou a grande confusão no povoado de Fátima, tendo a Cova da Iria como epicentro do fenómeno e manifestações sobrenaturais como ondas de choque – segundo testemunhas presenciais acabadas de chegar contando com a presença de aparições susceptíveis de um novo milagre. Mas com outros (os conservadores) afirmando ser mais uma obra de Satanás, ao fazer cair Nossa Senhora e usurpar o seu lugar. De um momento para o outro o grupo de Esteves Macuin e de Josefa Macarti poderia encontrar-se. Eram 17:00.

 

(imagens – Web)

 

Fim da 2.ª parte de 5

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publicado por Produções Anormais - Albufeira às 01:05