ALBUFEIRA
Um espelho que reflecte a vida, que passa por nós num segundo (espelho)
Um Dia na Vida de Esteves Macuin – 3/5
Novos Ficheiros Secretos – Albufeira XXI
(Histórias do Outro Lado)
Marte – Complexo de Cydonia
A Terra existia há pouco mais de 4,54C enquanto Marte datava de 4,65C. Nas suas transformações a implicação da constante K era insignificante. O que equivalia a dizer que num conjunto tão novo e concentrado como este, era natural que os cenários apresentados fossem bastante homogéneos e tendencialmente indiferenciados: e num sistema como aquele que rodeava o Sol, esta estrutura não poderia ser vista como algo que já pudesse em si interferir com outros conjuntos adjacentes, mas sim como uma célula ainda no seu período de desenvolvimento e adaptação ao meio envolvente – em transformação (e crescimento) e antes de se dar a sua eclosão. Assim o Sistema Solar deveria ser visto como uma célula fazendo parte de um grande Universo Vivo (organismo), lutando no espaço resultante da desconcentração inicial com outros Universos, integrando uma amplitude infinita de diferentes níveis paralelos e concorrenciais. A Terra e Marte viviam num sistema planetário mínimo, rodeando um pequeno foco de energia que os mantinha unidos e protegidos – como se fizessem parte de um condomínio fechado – e não era a sua diferença de idades, o seu nível diferente de desenvolvimento ou até a diferença da sua distância ao Sol, que lhes proporcionaria destinos e objectivos sem contactos, ainda por cima compartilhando matéria, energia e movimento e concretizando-se no mesmo espaço. A melhor explicação seria dada pela imagem dos espermatozóides lançados pelo desconhecido à procura da outra parte: na sua viagem alucinada pelo mundo os espermatozóides não deixam de o ser apenas porque só um deles concretiza o roteiro programado da viagem. Toda a grande construção irá dar origem a uma transformação que tudo (e todos) englobará, partindo-se posteriormente a membrana e aí entrando o resto do mundo – Os Outros, a Memória e o Conhecimento. E o que se passava na Terra já se passara em Marte. E noutros locais o mesmo ocorreria ou estaria mesmo a ocorrer: teria sempre que haver um factor comum de habitabilidade entre pontos pertencentes a uma mesma família (ou grupo). Porque teria que ser a Terra o único planeta possível de existência de vida e nesse mesmo Universo ao qual pertencia o Homem, este ser apenas uma das espécies dominantes e entre estas logo a mais atrasada? Se fazemos o Mundo à nossa imagem é porque nós somos o Mundo. Catarina EP Burne parou então o Simulador. Ainda tinha algum espaço para jogar (o marcador indicava 17/24 por sinal uma dízima infinita periódica).
Sentado na relva Esteves Macuin encontrava-se silencioso há pelo menos cinco minutos. Consultava uns dados do seu simulador, enquanto de uma forma preocupada ia olhando para a sua esquerda. Parecia agora um pouco mais nervoso o que nos começava também a incomodar: tentei chamar-lhe a atenção mas estava demasiado absorvido com as suas tarefas. Aí João Uaine levantou-se, dirigindo-se-lhe e tocando-o ligeiramente no ombro. Deu um salto, quase que gritou, reassumindo no entanto e muito rapidamente a sua estabilidade emocional. Pediu de imediato desculpa e para nos acalmar, ainda se riu connosco um bom bocado. À esquerda ainda se ouviu um alarido mas que durou poucos segundos. Nada se via. Na verdade não foi o que pensou Esteves Macuin. Este tinha (quase) a certeza de que uma das suas ligações centrais de comunicação tinha sido violada num determinado ponto anterior (e por essa razão achava estar já a ser perseguido, mas por um agente menor), mas agora o alerta vinha de sucessivos registos (claramente identificados) de intrusões ao sistema, vindas de níveis superiores e com acesso privilegiado (diga-se total). E nesse caso a Intervenção seria Directa. Teria forçosamente que se dirigir às suas origens e aí procurar protecção junto dos seus antepassados: só assim sobreviveria às regras impostas pelo Jogo. Ou não seria Deus a Entidade Central, o Operador?
Catarina EP Burne telefonou para o seu programador, solicitando-lhe para a colocar com a maior urgência em contacto com os periféricos sob a sua intervenção. Foi de imediato informada da intervenção local iniciada pela senadora Josefa Macarti, sua localização e canais de comunicação. Esta estaria na perseguição a Esteves Macuin supostamente por “acesso indevido e sem autorização previa por parte deste a áreas protegidas e podendo com as suas acções provocar danos colaterais e irreversíveis”. Desprezando (sem o sentido da ofensa mas no sentido prático) o arrazoado da sua colega em hierarquia (do mesmo nível em extensão, mas paralela em compreensão), solicitou uma ligação dedicada e em exclusivo à mesma, enquanto fazia a sua acção executiva que a colocaria antes de todos no seu Ponto de Encontro (no mapa do Tesouro marcado com um X). A conversa foi rápida e esclarecedora: apanhara de tal forma desprevenida e sem hipótese de reacção a sua colega Josefa Macarti, que ela nem tivera tempo de dizer não. Pegou nos seus acompanhantes, reorientou cronologicamente os acontecimentos aí registados de modo a manter o programa para aí estabelecido e como combinado deslocou-se para as novas coordenadas.
Em miúdo Esteves Macuin tinha ouvido muitas vezes nas tabernas minha da terra os mais velhos contarem entusiasmados e já com uns bons copos enfiados no corpo a lenda do tesouro do Castelo de Outono. Também as mulheres falavam dele, mas como diziam que o tesouro enterrado seria o de uma bela mulher que esperava que algum homem o encontrasse para assim casar com ele, falavam uma vez (se forçadas) para nunca mais. Era um castelo pequeno mas com muralhas esguias, prolongadas e que ainda nos encantavam e que passados centenas e centenas de anos, ainda nos falavam da vida e de todos aqueles que por lá tinha passado. Um mistério rodeado pela áurea de um tesouro. Morando nas suas redondezas esse lugar mágico fora o centro de muitas brincadeiras, aventuras e algumas lutas. Nelas muitas das vezes envolvendo o nunca encontrado tesouro, os que estavam contra e a favor. Mas nunca tendo encontrado nada, pelo menos até ao seu desaparecimento. Mas ele sempre tivera o pressentimento de que o Castelo de Outono seria na verdade o guardião desse tesouro, ele próprio um tesouro, só que não se sabendo onde, nem se sabendo como.
O desenho do senhor Antero – representando o objecto desconhecido
O senhor Antero viajava a caminho da sua casa na localidade de Rio Seco – depois de uma tarde de grande comezaina bem regado por um belíssimo vinho tinto da região – pensando nas boas horas passadas e nos petiscos aí degustados. A meio da sua viagem e perto de um cruzamento que ia dar ao que pareciam ser umas ruínas – com a sua idade já não via muito bem – teve que parar e ir fazer uma necessidade fisiológica. Tinha bebido muito e com a trepidação provocada pela viagem a bexiga estava mais sensível, urinando com mais frequência. A noite apesar da época do ano estava bastante agradável, com o céu descoberto e bastante estrelado. Só uma brisa mais fresquinha que por vezes soprava de Espanha é que por momentos estragava tudo. O silêncio era quase total, ouvindo-se aqui ou ali um ramo a abanar ou um bicho a falar. Acabou por se sentar um pouco sobre uma pedra ao lado da estrada e enquanto ia fumando um cigarro pôs-se a olhar para cima. Ao fundo surgiu o que parecia ser objecto luminoso. Num instante estava lá, como de seguida se encontrava sobre o monte de ruínas. Parou repentinamente, emitiu umas luzes estranhas e desapareceu logo por trás do monte. Antero pode avistar ainda que por instantes duas silhuetas na parte superior do objecto, parecendo ter caras humanas apesar de um nada orelhudas. Via-se uma ligeira claridade no ponto onde o objecto teria aterrado, tendo sido a mesma durante alguns segundos acompanhada por um zumbido (como se de uma máquina eléctrica se tratasse) que poucos segundos depois se extinguiu. Temporariamente voltou tudo ao silêncio. Olhou para o relógio que indicava estar quase nas oito da noite. Noutra altura qualquer teria ido espreitar mas agora não estava para aí virado. Resolveu esperar mais um bocado (até para ver o que acontecia) e enquanto comia a sanduíche de presunto que lhe tinham oferecido (para a viagem), bebeu mais um trago de aguardente (da termo) e acendeu mais um cigarro.
A pouco mais de vinte quilómetros do seu destino, os três pararam num pequeno café situado ao lado da estrada: e com João Uaine ao meu lado acompanhei-o ao interior do estabelecimento e aí comemos e bebemos, descansando um pouco o nosso corpo assim como os nossos pensamentos (enquanto Esteves Macuin consultava o mapa e os dados recolhidos). E antes de partirmos para esta terceira e última fase da sua estadia na Terra ainda combinamos as coisas e recordamos o passado. Nesse espaço de desmontagem Esteves Macuin não mais se conteve, acabando por abrir o seu mundo de sentimentos ao nosso mundo de percepção, agora que o ponto de transição se aproximava e que ele tinha definitivamente de se decidir: ou se sujeitava (ao seu passado) ou se propunha (a um novo futuro). Em conversa conjunta de amigos decidiram alterar o seu destino e procurar uma nova Porta para as suas Inquietudes (que agora eram de todos). Dirigiram-se então para Almeida.
Por volta das 21h00mn estavam à entrada de uma das portas de entrada da Praça-Forte de Almeida, deparando-se os três com uma solitária silhueta feminina mesmo à sua entrada. Esteves Macuin não parou deslocando-se na sua direcção. Ao chegar junto dela saudou-a, teve com ela alguns gestos de cortesia (e outros que não conseguimos interpretar), deixando-se os dois de seguida ficar numa prolongada e acesa conversa que se prolongou por cerca de quinze minutos. Então Esteves Macuin pediu-nos para o acompanharmos, entrando todo o grupo no interior da fortaleza. Reuniram-se então no interior de uma ampla casamata, onde dois outros indivíduos os esperavam. Sentaram-se todos em redor de uma rude mesa de madeira bem apresentada e guarnecida e enquanto se começavam a servir, Catarina EP Burne levantou-se da sua cadeira e com a ajuda de um monitor iniciou a sua oratória. Enquanto isso e a uns miseráveis quilómetros de distância Josefa Macarti abandonava o seu local de intervenção junto ao Castelo de Outono, abalada emocionalmente pela sua inesperada (e certamente com consequências) ultrapassagem lateral e acabando (sem intenções) por descarregar os efeitos provocados pela emissão abrupta dos seus sentimentos sobre o pobre Antero, que já sobre os fortes efeitos do álcool e num trajecto aos ziguezagues, subia lentamente a encosta do monte com a sua mota bem luminosa e cada vez mais fumegante: um raio certeiro atingiu-lhe o veículo, atirando-o pelo ar para o cimo de umas silvas. Aterrara direito mas levara um grande coice.
EP Burne – Encontro real ou simulação por programação
No monitor de Catarina EP Burne podiam-se ver algumas sequências de um conflito militar talvez passado nos séculos XVIII-XIX, envolvendo forças portuguesas e francesas. Nos episódios finais as forças inimigas e invasoras comandadas provavelmente por um dos generais franceses sob o comando de Napoleão Bonaparte colocam sob forte fogo de artilharia a Fortaleza Fortificada de Almeida, acabando o ataque por provocar uma forte explosão, destruindo completamente o castelo e deixando no mesmo estado grande parte da vila. Os franceses tomam então posse de Almeida, sendo poucos meses depois expulsos pelos nossos aliados ingleses. Mas neste caso esta apresentação não pretendia referir-se ao acontecimento histórico em si mesmo (à sua interpretação e conhecimento das suas causas e consequências), dirigindo-se apenas a um pormenor presente nas imagens: a violenta explosão registada. Ela teria na realidade ocorrido não por intervenção (deliberada) exterior – provocada pelo impacto de um projéctil da artilharia francesa que teria atingido um dos paióis da fortaleza portuguesa fazendo-o explodir – mas por intervenção (acidental) interna. Na verdade estaria em causa a sobrevivência de um elemento da sua espécie (como ela do sexo feminino) em fuga há já vários dias a autoridades políticas e religiosas de Espanha pró-bonapartistas (pretensamente por práticas de bruxaria) e recolhida acidentalmente perto da fronteira espanhola por batedores locais, previamente alertados do rápido avanço das tropas napoleónicas. A bela estrangeira aparentava estar extremamente fraca e prestes a desfalecer, sendo apenas acompanhada por um jovem ajudante, completamente perdido e praticamente incapaz. O capitão decidira de imediato ajudar a jovem, transportando-a com o seu ajudante até à protecção das muralhas de Almeida. Ali estaria protegida do frio da noite e dos seus inimigos e poderia recuperar as suas forças. Mas a pressão provocada pelo avanço sem qualquer tipo de oposição por parte das forças franceses e o início em força e em violência da actividade dos seus artilheiros, forçara a uma intervenção imprevista e de emergência dos observadores alienígenas, no sentido de salvaguardar a vida da sua colega de espécie retirando-a do terreno. Só que sucedera um incidente e cerca de trinta segundos depois do abandono da casamata por parte da donzela e dos seus acompanhantes (e já com todos do lado de lá e em segurança) a porta de saída desintegrara-se destruindo com a onda de choque tudo à sua volta. Por qualquer motivo a matéria em oposição acabara por se tocar, explodindo com elevadíssimos níveis energéticos.
E agora era Catarina EP Burne que ali estava, precisamente na mesma casamata e mais de 200 anos depois do aí sucedido: precisamente pelas 22:00 do primeiro sábado do mês de Novembro (dia 1) do ano de 2014. “O mundo era o resultado de interacções ocorridas num determinado espaço do Universo, no seu processo natural de transformação e evolução para outros níveis energéticos. Essa evolução concretizada a partir de um estado neutro da Matéria (neutro por invisível e indetectável e não por comprovada inexistência) era equacionada sobre duas variáveis: sendo uma o movimento (relacionando espaço e tempo) e a outra a sua massa (relacionando força gravitacional e aceleração). No entanto uma das variáveis introduzidas no sistema (integrado na realidade do programa que suportava o nosso Universo) na verdade não o era, não passando de uma mera Constante (abstracta) transformada indevidamente em parâmetro real: o Tempo. O tempo não passa de uma constante relacionando o Espaço Total com o nosso Espaço Particular: e quando os espaços se equivalerem o Universo terá evoluído para uma nova fase do seu crescimento (interno para externo), entrando em contacto com outros Universos e formando uma nova plataforma de contacto e reprodução. É que os Multiversos existem e requalificam-se por contacto (Eléctrico) e não através de intrusões mecânicas e ineficazes: tal como o Bem e o Mal são conceitos confusos e apesar disso conciliáveis (por inexplicáveis face aos mecanismos da Natureza e do Universo, logo inexistentes), o tempo só é aceite por ser uma boa maneira de nos produzir e eliminar e assim manter a Máquina Objectiva Viva (afinal o único objecto que nasce e que morre e tem direito a esse tempo de transição é o Homem – por ser produto de desgaste rápido e instantaneamente substituível por reprodução; e os outros não tinham alma e eram sempre recicláveis).” E assim se deixou levar (no início da sua oratória) a nossa Catarina EP Burne.
Então pegou numa folha e dela fez uma esfera. Num ponto da superfície da esfera enfiou uma caneta, fazendo a sua ponta sair num outro ponto da superfície da mesma. Pintou de seguida o ponto inicial com um corante vermelho e o outro com um corante verde. Fazendo pressão sobre o ponto inicial (e fornecendo-lhe energia e movimento) fê-lo coincidir com o ponto final, que após restabelecimento de todos os equilíbrios se integraram e deram origem a uma porta: que comunicando entre espaços não deixava de fazer parte dele. E então o ponto ficou amarelo. “Se não nos conseguimos desligar de todas as directivas e normas não naturais que orientam e condicionam desde sempre a nossa mente (uma espécie de lobotomia pré-natal e que todos parece atacar e possuir), a única alternativa viável será descaracterizar definitivamente o tempo retirando-lhe todas as suas prorrogativas, como os tempos limites e as suas etapas intermédias: e estando em dois tempos diferentes ao mesmo tempo, esta era uma forma de nos olharmos finalmente de vez e de frente, sem termos de recorrer a mais outro espelho deformado e comandado por um outro relógio. O espelho só nos dá uma imagem (distorcida por subliminarmente já manipulada – existem diferentes tipos de espelhos, utilizados conforme “as necessidades”) e o relógio ainda por cima a amputa”. E sem que nos apercebêssemos como, num momento estávamos na casamata de Almeida e no momento seguinte no Outro Lado da Lua, nas instalações base de Esteves Macuin. Talvez reorientando simplesmente os olhares se resolvessem muitas situações.
Um salto ao planeta Marte
Estava de novo de regresso à base. Tudo se encontrava como tinha deixado há pouco menos de vinte e quatro horas, com as tarefas quotidianas a serem integralmente cumpridas como previsto e com as duas biomáquinas a realizarem as tarefas a ele normalmente atribuídas, neste caso substituindo-o (por sua ordem) e cumprindo a sua agenda. E então vindo de uma porta lateral que nos ligava à sala de transição da base, dois humanóides provavelmente oriundos do Entreposto SS1 situado numa das colónias de Marte, dirigiram-se a Catarina EP Burne, saudaram-na respeitosamente e após uma curta troca de palavras puseram-se à sua total disposição: a intenção desta seria levá-los (Esteves Macuin, João Uaine e eu) a um outro ponto de espaço relativamente próximo e semelhante, onde poderiam esquecer e superar as suas recordações relacionadas com aquele espaço complexo senão mesmo doentio onde sempre tinham vivido, tentando deste modo contribuir para a abertura dos limites muito fechados dos seus órgãos dos sentidos, catapultando e direccionando os nossos processos mentais, para a infinidade das coisas e para a relativização de um único espaço (mesmo sendo aquele onde sempre evoluímos), perdido e integrando o todo e o nada, o caos e a organização. Novo salto e estávamos em Marte. E no espaço percorrido entre a Lua e Marte ainda tivemos um relance episódico dum momento da história do planeta Vermelho, onde vislumbramos (como se estivéssemos a espreitar a partir do interior de um buraco cilíndrico, rodopiando a uma velocidade vertiginosa e fazendo sobrepor-se acontecimentos independentes – paralelos e/ou concorrenciais) uma superfície marciana luxuriante, preenchida aqui e ali por lagos, rios ou outras grandes extensões líquidas, onde seres vivos usufruíam do ambiente que os acolhia (como uma mãe com o seu filho na barriga) e viviam as suas vidas que este belo mundo lhes proporcionava; e repentinamente a vida entrou em regressão, a atmosfera foi-se esvaziando e as águas marcianas desapareceram (quase por completo) da sua superfície. Algo vindo do exterior atingira violentamente o planeta Marte (como se pode ver pelos vestígios arqueológicos bem visíveis em muitas regiões do planeta, algumas delas parcialmente calcinadas e parecendo resultar de alguma brutal e super-energética explosão) liquidando completamente a civilização e todas as estruturas até aí existentes e tornando-o num mundo seco, árido e desértico. Ou seria algo que, em vez de ter acontecido, ainda iria acontecer (como se colocasse em pausa e pusesse a andar para trás)? E tudo isto passado num espaço sem tempo em que mesmo estando ali, tal não era impeditivo de uma outra réplica nossa poder estar acolá ou mesmo ali também. E Catarina EP Brune sabia bem disso como ninguém, considerada como era uma grande jogadora e uma formidável simuladora: era detentora da maior colecção de Originais.
Estávamos na região marciana de Nova Cydonia. Pela sua topografia remarcável e se aí imaginássemos a presença de água, esta poderia ter sido num qualquer espaço ou dimensão escolhida, uma grande urbe costeira deste misterioso planeta vermelho. Tínhamos sido todos transportados para uma sala completamente isolada do exterior, apresentando apenas uma porta de comunicação e um espelho frontal transparente, atrás do qual era perceptível a presença de um indivíduo debruçado sobre um painel de instrumentos, que parecia ir manipulando as teclas de um qualquer aparelho, enquanto ia espreitando quase que mecanicamente cada 5 segundos. Ao ver-nos chegar acenou imediatamente e logo apontou a porta de saída. Saímos assim da Sala de Salto TM-3 e de uma forma surpreendente, logo ao primeiro passo e sem que tivéssemos sequer tempo para hesitar, o que nos esperava não era apenas mais um habitáculo artificial de mais uma colónia perdida no Universo, mas de facto a apresentação do planeta a estes novos visitantes e convidados, através da oferta para usufruto de um cartão de visita natural: pisávamos directamente o solo do planeta em subterrâneos atravessando túneis e galerias existentes no seu interior, possuindo uma atmosfera compatível com as necessidades do nosso organismo e terminando em certos locais mais elevados em fantásticas clarabóias naturais e panorâmicas, que nos permitiam observar tudo o que lá fora nos rodeava. As cores eram verdadeiramente acolhedoras e hipnotizantes e a iluminação própria que o material emitia, só lhes dava um aspecto ainda mais intrusivo e penetrante, como se as misturas de cores que presenciávamos fossem uma das assinaturas ainda reconhecidas e válidas deste nosso conhecido planeta.
(imagens – Web)
Fim da 3.ª parte de 5